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Nunca me fez tanto sentido a leitura das teorias existencialistas,
como nos dias que correm, nos meus 47 anos de vida e os aproximados 30 de
lucidez, nunca senti tão presente as angústias, desesperos da existência,
alertados por Sartre e Heidegguer, quanto agora. A fala de Eduardo Viveiro de
Castro, a quem tenho profundo respeito e admiração, é tudo o que gostaria de
ler e ouvir em referência ao fatídico incêndio no Museu Nacional, ou ainda ao
desaparecimento histórico do Brasil.
A vida significada, ressignificada, que faça sentido só é possível
por meio de elementos que a justifique, é assim para a arqueologia,
antropologia, biologia, história, geografia, linguística e todas as vertentes
científicas que são capazes de, com as suas asas fornecer subsídios para que os
acontecimentos ganhem significados, aos olhos, ouvidos, tatos e olfatos das
pessoas. Perder um acervo como o do Museu Nacional é perder um oceano de
possibilidades e jogar por terra a vida de centenas de milhares de
pesquisadores, lembro aqui da letra do Gonzaguinha: Um homem se humilha / Se castram seu sonho / Seu sonho é sua vida / E vida é trabalho / E sem o seu trabalho / O homem não tem honra
/ E sem a sua honra / Se morre, se mata / Se morre, se mata / Não dá pra ser feliz (…). Bem adequada ao
sentimento comum a uma boa parcela de pessoas que entendem a magnitude do que
se perdeu: Não dá pra ser feliz!
Isto é existencialismo, pelo menos é o que se aproxima, na minha
rasa compreensão, questionar a razão de tudo isto, e a minha própria razão
aqui, agora, neste lugar. Sei que para a maioria das pessoas isto não fará
sentido algum. Mas sei que por menor que seja a sensibilidade nas pessoas podem
sentir a esterilidade na relação com as coisas, com o que importa – embora a
semântica do termo importar (ser importante) esteja deslocada, pareça
diferente, esteja mais individual, egoísta, autorreferente, aesthetics. Podem sentir um imenso oco,
buraco, vazio que evolui para um soco no estômago, é orgânico mesmo, assim como
era orgânico o Museu, um imenso organismo a contar a história de todos nós, uma
velha avó sentada sobre as suas pernas transformando em narrativa os meios que
nos trouxeram até aqui. A avó foi morta a machadadas, o arado de criar desertos
decepou-lhe a cabeça.
Quando Viveiros de Castro diz que no Brasil governar é criar
desertos, ele fala do ponto de vista de quem já assistiu muita morte de
narrativas essenciais para fundar outras narrativas, fala do lugar de quem
também recebeu o soco no estômago sem chances de revidar. Quando defende que o
local permaneça como ruína, memória das coisas mortas. Considera que a morte de
uma Avó/Museu é o fim. Estamos fadados a matar as avós, silenciar as suas
narrativas, estamos existencialmente estéreis.
Palmas-TO, 06 de setembro de 2018
Juliete Oliveira