sexta-feira, 15 de fevereiro de 2013

Corpo holograma


No mesmo dia em que uma chuva de meteorito atingiu a terra ferindo algumas pessoas, o que pode ser considerado um fato raríssimo, assisti acidentalmente a um fato que no caso da Amazônia não é de maneira nenhuma raro, o que é raro, é assistir a uma batida policial em um local de possível exploração sexual de menores! Estava almoçando ao contemplar a cena, e foi impossível continuar a degustar o delicioso almoço aos moldes nordestino que era servido no momento. Estou no olho do furacão! Em Altamira/PA, que hoje se constitui um dos principais locais de migração de mão-de-obra, de todas as espécies no território nacional.



Ver um objeto é ou possuí-lo à margem do campo visual e poder fixá-lo, ou então corresponder efetivamente a essa solicitação, fixando-o. Quando eu o fixo, ancoro-me nele, mas esta ‘parada’ do olhar é apenas uma modalidade de seu movimento: continuo no interior de um objeto a exploração que, há pouco, sobrevoava-os a todos, com um único movimento fecho a paisagem e abro o objeto.” Merleau-Ponty. O objeto aqui é o corpo da menina, que também é o meu, o da minha filha, o da minha mãe, seria o objeto que me habita e que é habitado por mim. Doeu, dói. As meninas sendo recolhidas em uma ambulância da secretaria municipal de saúde. Denotou doença, falta de sanidade, enfermidade. Estamos, somos enfermas todas as mulheres quando o nosso corpo é alvo do prazer mórbido do outro, quando a violência invade e profana entranhas tão jovens e por vezes inocentes.

A violência contra a mulher não arrefece. Quando se oferece oportunidade de trabalho no Brasil, com a abertura ainda colonial de frentes de serviços, oferece-se sexo, carne barata, ou até gratuita, oferece-se fome, descontrole, ant-desenvolvimento e um manancial de sofrimento que pode se perpetuar por inúmeras gerações após o fato. Com todo o discurso que temos hoje na ponta da língua, em torno da sustentabilidade, erramos sempre, quando o ativo envolvido é o corpo.

Holograma é a fantasia de captar a realidade ao vivo que continua – desde Narciso debruçado sobre a sua fonte. Suspender o real a fim de o imobilizar, suspender o real no mesmo momento que o seu duplo. Debruçamo-nos sobre o holograma como Deus sobre a sua criatura. “A Polícia Civil desarticulou, na noite de ontem, uma casa de prostituição que funcionava por meio de um esquema de tráfico interno de pessoas para exploração sexual, na zona rural de Vitória do Xingu, oeste do Pará. No local, cinco pessoas eram mantidas em cárcere privado – uma travesti, três mulheres adultas e uma adolescente – todas da região Sul do Brasil. O gerente e um funcionário do local foram presos em flagrante e encaminhados para a sede da Superintendência da Polícia Civil na Região do Xingu, em Altamira, para lavratura dos procedimentos policiais. O crime foi denunciado por uma adolescente de 16 anos, que fugiu ontem (13) do estabelecimento. A prática criminosa foi confirmada, por volta de 22 horas, durante operação policial deflagrada pela Polícia Civil sob a coordenação do superintendente regional, delegado Cristiano Marcelo do Nascimento”. (http://www.policiacivil.pa.gov.br/?q=content%2Fpol%C3%ADcia-civil-desarticula-esquema-de-tr%C3%A1fico-de-pessoas-em-vit%C3%B3ria-do-xingu)



Juliete Oliveira
Foto: Takeshi Mano
Altamira/PA, 15 de fevereiro de 2013