sexta-feira, 22 de outubro de 2010

DAS COISAS QUE SE ARREMESSAM NOS POLÍTICOS

Esta é a fase do espetáculo em que o público, não aguentando mais o ator, começa a arremessar toda sorte de objetos, por vezes até dejetos, em cima dele. Significa que não há reviravoltas possíveis, nem atos de heroísmo nem de pura covardia, nada resgatará o espetáculo de seu final pífio. O Político, talvez até mais do que o artista, adora palcos, e também tribunas, palanques, plataformas. Por mais desagradável que seja o cenário, por mais grotesco que seja o enredo, aí ele encena o melhor dos mundos. Apenas a alguns centímetros do chão, ele se acredita numa torre de marfim. Refugiado da carência, fraqueza, impotência diante da vida. Sobem com ele aí toda burocracia e jurisdição. Juntos falam melhor do progresso social e econômico que promovem. Dos grandes avanços da Indústria e do Mercado. Das notáveis contribuições do Partido na grande cidade que governam. Daí para o resto do país, sobre o palco, anuncia-se a melhor das escolas, não porque indivíduos mais educados tornam-se mais produtivos, mas porque o público “sonha” com essa escola. Ela vai bater á sua porta todas as manhãs e todas as noites que o filho sair para estudar sem saber se ele voltará vivo. Todos humilhados aí nesse pesadelo em que também é incerto toda sorte de direito: saúde, emprego, comida. Infelizmente o “respeitável” público não tem como passar sem isso. Daí que todas essas coisas não deixam de ser implacavelmente anunciadas, recapituladas, de punhos erguidos, como maravilhas de um mundo iminente, com a condição, é verdade, de serem mais uma vez repetidas amanhã, como forma de reativar os ânimos e dissuadir os pessimistas. Vida e bem-estar social só se opõem do ponto de vista dos políticos. Para eles se está sempre nas etapas antecedentes do desenvolvimento. O melhor dos mundos nunca é efetivo. Se crianças ainda morrem de fome no Norte e Nordeste, se o tráfico de drogas domina cidades inteiras, se não há médico, remédio, salário, vergonha na cara – eles brandem tudo isso, porque tudo está prestes a melhorar... Enquanto nada acontece, eles se distraem com o grande público. Riem da corrupção, da ineficiência, dos altos impostos. Pelas mesmas razões estúpidas a que sempre recorrem, conclamam o público a votar. Tudo a um passo de acontecer. A escola, a saúde, o emprego, a comida. Só que por um descuido, uma falha da produção do espetáculo, ou talvez animado pelas pesquisas ou pelas benesses delirantes do cargo que disputa, ou ainda, por amor ao bom público, um deles desce do palco e, longe dos holofotes, com passos que se revelam trôpegos, se põe a andar entre as pessoas; e ali, de súbito, tudo começa a dar errado: a tentativa de proximidade não surte efeito, os gestos resultam falsos, e todos começam a perceber os signos de um triste desenlace. Que o enredo é falho, a fala é de um clown e a maquiagem esconde a face de um ator ruim. O público se depara com um espetáculo que já deu, se esgotou, saturou a todos. A esse ator só resta fugir, partir pra outra. É a fase do espetáculo em que o público começa a arremessar toda sorte de objetos... Assunto encerrado, cortina!


Ney Ferraz Paiva
Salgueiro - PE 22 de outubro 2010

Um comentário:

  1. Vida de estrela não é fácil. :)

    Concordando com seu texto, vejo que é nítida a adoração que nossas Ilustres figuras públicas atribuem aos espaços e posições de destaque perante a nossa sociedade. Vejo, também, que se colocam em uma postura de protagonista na história de toda uma nação, mas que para garantir o seu papel de destaque, transformam o ouvido do corpo de jurados (o povo, com seu poder de decisão) em verdadeiros vasos sanitários, onde despejam todas as possíveis fantasias e ilusões de todo o nosso povo. Sendo assim, para aqueles que se iludem com todo um discurso interesseiro e de falsas propostas, que é ludibriado por uma possível realização, tendem a defender com unhas e dentes a tal figura que falou aquilo que se queria ouvir. Por outro lado, aquele que não se sente contemplado pelo discurso apresentada se vê com uma única coisa a fazer... Atirar seja lá o que for. Como forma de protesto para dizer: “Ei, olha mim. Eu estou aqui e tenho o meu papel também.”
    Vejo que tudo isso retrata a busca de um povo que têm como lema um velho ditado popular, onde diz: “Enquanto há vida, há esperança.”

    Parabéns pelo maravilhoso texto e um forte abaço. Kati

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